segunda-feira, 27 de abril de 2009

Jornal: o cadáver impresso (Jardel Dias Cavalcanti)

"O jornal é o cemitério das ideias." (Proudhon)

O jornal se transformou num anãozinho depois que a internet foi inventada. E quanto mais o tempo passa, menor ele vai se tornando. E, por sua vez, maior vai se tornando a internet. A questão da significância da imprensa impressa tem seus dias contados. Doa a quem doer.

Não resta dúvida que ao jornal impresso estão relacionados uma série de pequenos prazeres. Tomar o café da manhã de domingo abrindo e dobrando lentamente aquelas gigantescas folhas de papel, selecionando por uma ordem de importância absolutamente pessoal que notícias ler primeiro, quais ler depois e quais não ler, comentar com o parceiro as novidades do mundo da política, da cultura e dos esportes, ver que filme assistir naquele dia, é realmente um rito social do qual muita gente participa. E gosta de participar.

Segundo disse Hegel, se não me engano com a autoria da frase seguinte, "o jornal é a oração matinal do homem moderno". De fato. Mas não para a nova classe de leitores contemporâneos jovens, que acorda ligada na internet. Ali abundam notícias muito mais variadas, mais rápidas e de enfoques os mais dispares possíveis. Coisa que a mídia impressa não dá conta. E em quantas línguas você puder ler. Universalizando a informação.

Lembro-me que me interessei, certa vez, por começar a ler o Le Monde e o Nouvelle Observatoire para treinar meu francês e ver a ótica da mídia francesa sobre problemas internacionais que me interessavam na época. Onde comprar tais jornais? Como pagar por eles? Eu teria que ir a São Paulo, pois uma cidade caipira como Campinas não abriga esse tipo de importação. Nem tínhamos a FNAC ainda. Muito menos a Livraria Cultura. E as bancas não passavam do trivial. Meu desejo foi para o buraco, pois eu não tinha a mínima condição de gastar com uma passagem até São Paulo e muito menos pagar por um jornal importado.

Veio a internet e com ela a possibilidade de navegar mundo afora, com infinitas possibilidades de receber muito mais informações, como disse acima, em quantas línguas eu conseguisse ler e com velocidade muito maior.

A atualização é outro fator que pesa na questão da maior importância da mídia virtual sobre a impressa. Notícias são atualizadas por minuto. Fotos e vídeos enviados em tempo quase real para os sites que exibem os fatos em tempo real. Quem pode competir com isso?

Outro dado é a questão da liberdade de imprensa. As notícias fornecidas por mídias virtuais alternativas ganhavam em liberdade das mídias controladas por patrocinadores. Por exemplo, as fotos da violência praticada por americanos na sua última guerrinha, estampadas na internet, desconcertaram o poder que camuflava tais fatos. Alterou a opinião pública sobre a invasão americana. Outro exemplo: índios nos confins da Amazônia denunciaram, via internet, para órgãos internacionais, desmatamentos criminosos. A mídia impressa estava longe desse alcance. O conceito de mídia, em casos como esses, vai se alterando significativamente.

O tamanho do universo que cabe e se revela a partir desta caixinha que é o visor do computador não pode ser medido. Estamos no meio de uma revolução que transformará nossos conceitos, inclusive, o de realidade. Revolução sem volta. Transformação acelerada.

A mídia impressa vai perdendo rapidamente seus consumidores. Ninguém mais quer recortar e guardar notícias de jornais se pode tê-la no arquivo do próprio jornal virtual ou num CD ou pendrive. Ninguém mais quer pagar por uma notícia que pode ter de graça, abundantemente, no mundo virtual.

Há os nostálgicos, evidentemente, que não desprezam o dedo sujo com a tinta dos jornais impressos no Brasil. O ritual é mais importante que o significado das notícias. Afinal, passar três horas mergulhado num jornal de domingo nos livra de ter de olhar para nossas esposas ou maridos, ou prestarmos atenção às bagunças de nossos pequenos e ativos filhos. Ou nos faz ter a ilusão de que alguém está olhando para a realidade pra nós, descuidados da mesma que estamos ao sabor do matinal suco de laranja e do cheiro do café. Mais ainda, o jornal é um confortável calmante para as manhãs ensolaradas de domingo. Diferente da internet, que exige quartos de um semi-breu deprimente. Afinal, poucos ainda têm acesso ao laptop. Mas isso é uma questão de tempo. De pouquíssimo tempo, eu garanto. Pois já se pode comprar tal ferramenta por 600 reais por aí. O sol da manhã será salvo e o jornal impresso liquidado quando todos puderem abrir seu pequeno computador sob a sombra de uma árvore, num parque, ou em casa, sob o sol que se deita na nossa pequena varanda.

Outro fato estrondoso é que a internet possibilita coisas que a mídia impressa não poderia jamais fazer, como é o caso de abrir as portas do mundo para o cidadão de qualquer lugar do planeta, da mais recôndida zona rural até os centros urbanos mais antenados. Os satélites estão a cada dia mais poderosos e distribuídos amplamente na misteriosa escuridão dos céus, misturando-se e confundindo-se no seu brilho com as estrelas reluzentes. Conectar-se à internet vai ser um fato comum no planeta Terra, como beber água, graças à presença dos satélites.

Aviso aos navegantes: só não sabe o tamanho do mundo quem não consegue ir além do tamanho da folha de um cadavérico jornal impresso.